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literatura // Adeus, Saramago

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    revistabastiao
  • 22 de out. de 2014
  • 2 min de leitura

Autora: Lisiane Danieli


Minha relação com José Saramago iniciou em 2008, quando, para as disciplinas de Língua Portuguesa e Literatura, no Ensino Médio, foi solicitado que lêssemos Ensaio sobre a cegueira. Sem saber que o título era dele, já tinha visto o filme no cinema. Sem entender a importância posterior que o autor teria para mim, lidei com a obra como uma qualquer, mas não era.


Depois desse Ensaio, algumas outras leituras de Saramago foram sendo atribuídas ao meu acervo, e algumas outras ainda me faltam. Sempre que possível, adquiro esses livros não lidos, que esperam sua vez de leitura na estante já cheia de casos parecidos.


Por ocasião do meu aniversário, no mesmo mês de lançamento do derradeiro e inacabado livro de José Saramago, Alabardas, alabardas, espingardas, espingardas, ganhei-o. O presente, já ansiado, serviu como justificativa para abandonar leituras em curso e mergulhar, por curtos dois dias, nessa última novidade do autor.


Era típico em suas obras que a natureza humana, seus questionamentos, seus princípios e suas virtudes fossem retratados de forma única. Saramago escrevia a vida de maneira a nos colocar sempre em desconforto e reflexão sobre o que somos e o que podemos ser. Não diferente, este último livro traz a reflexão sobre as guerras, sempre presentes, a banalidade da violência, e, ainda, sobre o que o homem, como indivíduo, poderia fazer para pôr fim a elas.


Artur Paz Semedo, protagonista do romance, trabalha há décadas em uma empresa de armamento, a Produções Belona S.A., e, vale lembrar, gosta muito do ramo. Sua esposa, Felícia, é uma pacifista e, por tal, está separada de Artur. O protagonista assiste ao filme de guerra (de seu grande interesse) L’Espoir e lê o livro homônimo de André Malraux. Em uma curta passagem, Malraux retrata a possibilidade de sabotagem dos funcionários de uma fábrica bélica na época da Guerra Civil espanhola. Esse fato deixa Semedo tão indignado que o faz desistir da leitura. Ao ligar para a (ex-)esposa para contar sobre o livro, ela o dá a ideia pesquisar sobre a Belona.


A partir da vontade de conhecer mais sobre os negócios feitos pela empresa nos anos 1930, época de grandes conflitos, Artur aceita a sugestão de Felícia e começa o desenrolar do romance. Os três capítulos existentes são o suficiente para prender o leitor. Há vontade em saber o que o protagonista encontraria em suas pesquisas e, além disso, quais seriam as consequências dos novos conhecimentos.


O que acontece depois da frase inacabada que termina o último capítulo? Não é fácil saber. Sabe-se, apenas, que um sonoro “vai à merda”, dito por Felícia a Artur, seria o que concluiria a narrativa, segundo José Saramago. Porém, mesmo que não concluído e não de todo explicado, o livro tem o potencial que se esperava do autor.


É difícil dizer o que sinto em relação ao livro. Lê-lo foi muito triste. Terminá-lo, um pouco mais. Entretanto, tento o consolo de que, assim que morrer, vou ao céu dos ateus e questiono o próprio autor quanto à continuidade da obra. Espero que até lá ele já tenha escrito mais alguns, mesmo que, em vida, pensasse ter escrito tudo o que deveria.

 
 
 

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Revista Bastião | Porto Alegre | 2014

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